Reportagem elaborada pelos alunos do Curso de Jornalismo (UFRN):
Ailton Salviano
Arthur Tavares
Ilo José Aranha
Júlio César Lima
Pedro Miguel
Thiago Marinho

A cada 36 minutos, uma mulher morre no Brasil, vítima de câncer de mama. Essa informação de 2006 é da Sociedade Brasileira de Mastologia que estimou para aquele ano, 50 mil novos casos da doença no país. A neoplasia maligna da mama feminina, termo médico para essa enfermidade, é o tumor com a segunda incidência no Brasil.

Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), o Rio Grande do Norte apresenta um índice de 31,88 casos para cada 100.000 mulheres – é o terceiro maior do nordeste (dados do ano 2006). Embora parte da população feminina brasileira, após as campanhas informativas sobre a doença, tenha mudado de hábito – pratica o auto-exame das mamas e procura com maior freqüência os exames periódicos – a classe médica considera os números preocupantes.

Para a mastologista, coordenadora da residência médica em Mastologia da Liga Norte-Riograndense Contra o Câncer, Teresa Cristina Andrade de Oliveira, é mais que urgente, a necessidade dos órgãos públicos de saúde implantarem uma campanha voltada exclusivamente para o câncer de mama, semelhante a que existe para o câncer do colo do útero.

Teresa Cristina enfatiza ser importantíssimo o diagnóstico precoce dessa enfermidade. Em outras palavras, descobrir o tumor no início, além de facilitar o tratamento, aumentam as chances de cura. Conforme a ginecologista Maria da Penha Barbato na apresentação do folheto “Câncer de Mama – Como Prevenir”, a sombra do medo deve ser afastada. Ela insiste na recomendação das consultas ginecológicas anuais e exames complementares como a mamografia e a ultra-sonografia, as grandes armas que a medicina dispõe contra a doença. 40% das mortes poderiam ser evitadas com os exames preventivos.

O câncer de mama foi descrito (não com esse nome) no Egito, 1600 anos antes da Era Cristã. Originalmente, seu tratamento era feito com substâncias cáusticas ou com ferro quente que são técnicas de cauterização. Durante séculos, os médicos descreviam nas suas práticas, a conclusão – não há cura.

No século 17, com a melhor compreensão do sistema circulatório, os médicos puderam estabelecer uma relação entre o câncer de mama e os nódulos das axilas. No século seguinte, médicos franceses e escoceses iniciaram a remoção desses nódulos. A mastectomia ou a retirada (ablação) parcial ou total da mama começou em 1882 e tornou-se um procedimento cirúrgico até a década de 70 do século 20. Atualmente, existem técnicas eficazes de diagnóstico e cura, inclusive na medicina brasileira.

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Médica Teresa Cristina: “é importantíssimo o diagnóstico precoce”

COMO PREVENIR

Mesmo com o avanço da medicina, não são conhecidos todos os fatores que levam ao câncer de mama. Para explicar os altos índices da doença em áreas metropolitanas, os oncologistas associam a fatores como alimentação, modo de vida, envelhecimento da população e outros
Para a médica Teresa Cristina, o auto-exame das mamas de modo freqüente é a forma mais simples e importante de prevenção. A recomendação médica é que esse exame seja feito pela própria mulher, de preferência uma semana após a menstruação.

A recomendação médica é que se for encontrado um nódulo na mama, não se impressionar, pois a maioria deles não é de origem cancerosa. O tecido mamário é irregular, a às vezes surge uma formulação nodular; mas, se apalpar um carocinho, procure o médico imediatamente. A medicina preventiva ainda é um dos principais remédios na cura de todo tipo de doença.

A maioria dos nódulos é benigna – não cresce tão rápido nem invade outras partes do corpo. Os benignos mais freqüentes são nódulos – como o fibroadenomas (sólidos) – e cistos. Os fibroadenomas costumam ser mais comuns em jovens na faixa dos 20 anos; geralmente, o médico encaminha a paciente para o exame de ultra-som, a fim de confirmar o diagnóstico. Não precisam necessariamente ser retirados; se o médico optar pela retirada do tumor, será feita uma pequena cirurgia, com anestesia local.

Os cistos são as alterações mais comuns nas mamas, em geral são dolorosos e aumentam de tamanho antes da menstruação, mas não se tornam malignos. Costumam afetar as mulheres de 30 a 50 anos de idade e tendem a desaparecer na menopausa. Os cistos são identificáveis pela ultra-sonografia, eles são drenados através de uma agulha fina para a retirada do liquido, que será examinado a fim de se determinar o tipo de célula.

As secreções da mama tem também o seu valor para diagnóstico, principalmente se são espontâneas e sanguinolentas. Mas nem toda secreção significa câncer. Só o médico poderá fazer essa avaliação.

Mamografia – Os médicos recomendam que esse método de prevenção seja realizado a cada dois anos por mulheres a partir dos 40 anos. Após os 60 anos, o intervalo deve ser anual. Isto não pode ser uma norma rígida; dependendo do caso, o médico orienta em quanto tempo a paciente deve fazer esse exame. Há ocasiões excepcionais que o médico pode recomendar a mamografia para jovens de 20 anos.

O DESCONHECIMENTO CAUSA O MEDO

O auto-exame, segundo o mastologista Eliel de Souza, foi erroneamente difundido na população. Na verdade, afirma Eliel: “esse exame deveria ter sido divulgado para o autoconhecimento do corpo e não com a única finalidade de procurar um câncer. Isto do ponto de vista psicológico é preocupante”. E complementa: “hoje, apenas 23% das mulheres fazem o auto-exame e às vezes não fazem bem feito. A maioria delas alega ter medo de encontrar a doença, outras dizem que não sabem fazer e as demais não se interessam ou preferem ser examinadas pelo médico. Mas na essência, tudo envolve o medo”.

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Mastologista Eliel de Souza: “O erro foi divulgar o auto-exame como meio para procurar câncer”

Para esse mastologista, o recomendável seria iniciar o auto-exame na puberdade – não para encontrar a doença, mas para habituar a jovem a conhecer as características de uma mama normal. No caso da mulher adulta, continua esse autoconhecimento. Recomenda o dia para o auto-exame, uma semana após a menstruação. Para as que não menstruam, pode ser qualquer dia, de preferência aquele em que a mama está mais sensível. As que não menstruam, mas ainda possuem ovários, sentem, em alguns períodos do mês, dor na mama. Devem escolher uma época do mês sem dor ou desconforto para fazer o auto-exame.

Os psicólogos confirmam que o primeiro medo da mulher ao consultar o médico é ter o câncer. Quando ela sabe que tem a doença, aí o medo é de perder a mama. “Hoje a gente tem tentado preservar a mama, dentro do possível, de acordo com os princípios da ética e com o proceder médico” afirma Eliel de Souza, autor de um dispositivo de pesquisa denominado “Procedimento Referencial do Espírito da Lesão Mamária” (PRESLEM). “Antes da cirurgia de um tumor de 3 a 4 cm, fazemos um tratamento quimioterápico. Com essa quimioterapia, o tumor pode ter uma resposta muito boa e desaparecer completamente. Após isso, a mamografia e a ultra-sonografia nada detectam, então, dependendo do paciente, nós tiramos apenas aquela área do tumor e a mama é preservada”, cita. Para não correr riscos de deixar algo microscópico, complementa o médico, colocamos previamente um corpúsculo de material rádio-opaco dentro do tumor que os raios-X podem detectar.

Há vinte anos, independente do tamanho do tumor e por falta de opções de tratamento, a mulher perdia a mama. Pela inexistência dos quimioterápicos de hoje, o cirurgião, por questão de segurança, assim procedia. Além da mama, retirava até os músculos do tórax, por exemplo. Hoje, mesmo nos casos extremos da retirada da mama, é possível sua reconstrução com a cirurgia plástica usando partes da gordura do abdome ou músculo da parte posterior da omoplata ou com o complemento de silicone.

HOMENS TAMBÉM TÊM CÂNCER DE MAMA

As estatísticas têm demonstrado que para 100 casos de câncer de mama, um afeta o homem. Segundo o médico Eliel de Souza, o homem não está livre dessa mal, principalmente aqueles que usam hormônios para crescer as mamas. Alguns podem ter a Síndrome de Klinefelter – uma doença genética que altera a mama e provoca uma produção excessiva de hormônio.

O câncer de mama nos homens geralmente é mais grave. O homem não dispõe, semelhante à mulher, de tecido mamário abundante e quando a doença aparece, normalmente está infiltrada no músculo e aí se expande com maior rapidez.

COMO TRATAR E AS CHANCES DE CURA

A cirurgia é o procedimento padrão. Ela é específica para cada paciente. Tem a complementação da radioterapia e da quimioterapia que pode ser feita antes ou após a cirurgia. Existe também o tratamento chamado de anti-hormonioterapia. Trata-se de um medicamento capaz de inibir a ação dos hormônios em alguma célula tumoral. Semelhante a essa variedade de tratamento, há um envolvimento multidisciplinar em que se unem o cirurgião mastologista, o radioterapeuta, o oncologista clínico, o fisioterapeuta, o enfermeiro, o psicólogo e o assistente social.

Para os médicos, as chances de cura do câncer de mama estão diretamente relacionadas com o estágio da descoberta da doença. Segundo a médica mastologista Teresa Cristina, “quanto mais cedo a paciente descobre o nódulo na mama, mais chance de cura terá”. Daí a importância do auto-exame e dos exames preventivos regulares. A descoberta tardia contribui para aumentar os índices de óbitos. Na Liga Norte-Riograndense Contra o Câncer, 80% dos casos que chegam à clínica, estão em estágios avançados. A médica alerta: “aqui tem chegado paciente com 17 anos, o que reforça a recomendação do auto-exame a partir da puberdade”.

No caso dos homens, segundo a médica, o quadro é mais agressivo por conta da rapidez com que a doença se expande. Há também o preconceito. Como esse mal está muito ligado à mulher, o indivíduo que tem câncer de mama não procura ajuda com vergonha e deste modo, dificulta o tratamento. Muitas vezes, quando procura, está muito avançado e a doença tem migrado para outros órgãos.

A médica Teresa Cristina lamenta não haver uma campanha conjunta dos órgãos de saúde nos âmbitos federal, estadual e municipal, com a finalidade específica de conscientização sobre o câncer de mama. A população continua desinformada a respeito da doença.

Para efeito de tratamento, a referência é a Liga Norte-Riograndense Contra o Câncer – LNRCC. Trata-se de uma instituição pioneira na realização de procedimentos de última geração. A liga é uma entidade filantrópica, recebe pacientes de todo o estado. A demanda é muito alta para um número limitado de leitos. A lista de espera é grande e muitas vezes o atendimento de urgência é prejudicado quando todas as dependências estão ocupadas, completou a médica.

O APOIO FAMILIAR SUPERA O IMPACTO EMOCIONAL

Para a psicóloga da Liga, Flávia Roberta Alves, “a doença assusta e pode afastar as pessoas do tratamento e, assim, da recuperação. O diagnóstico causa mudanças subjetivas, pois envolve o medo de perder a vida, parte do corpo, a família, o marido. Medo de deixar de existir a partir de um seio ou de sua própria concretude”.

No caso da mulher que foi submetida à mastectomia radical – retirada total das mamas – o abalo psicológico é maior. Os seios são símbolos da feminilidade e perdê-los é traumatizante. Para Flávia Roberta, o câncer tem cura e para a sua recuperação, tanto física quanto emocional, é importante o apoio da família. Segundo a psicóloga, “uma paciente que recebe o apoio familiar apresenta maior adesão e resposta ao tratamento, pois se sente segura e motivada para continuar a luta pela vida”.

As mulheres que fizeram tratamento na Liga formaram, há 14 anos, o Grupo Despertar, para relatar experiências de cada uma sobre a luta contra o câncer de mama. A enfermeira aposentada, Gilvanete Guedes de Carvalho, 53, disse que “no início contavam com apenas 20 mulheres; hoje têm mais de 100 cadastradas e as reuniões têm em média, a presença de 60 mulheres”.

A aposentada Francisca das Chagas Medeiros, 67, faz parte do grupo desde o ano 2000, após vencer um câncer de mama, diagnosticado precocemente. “Eu me sinto gratificada pelo que estou fazendo, Eu estava aposentada sem fazer nada, aí, graças a Deus, tive esse câncer. Hoje digo isso porque arranjei um trabalho voluntário que tanto a gente dá como recebe experiência”, completou.

A mais recente participante do Grupo Despertar é a cabeleireira Maria Rosa dos Santos, 42 anos. Submetida a uma mastectomia total, fez 28 sessões de radioterapia e 8 de quimioterapia o que provocou a perda dos cabelos. Rosa se pergunta: “como uma pessoa que trabalha com cabelo pode ficar sem nenhum cabelo?”. Aconselha as mulheres que passaram ou têm medo de passar por essa situação: “ter muita fé, levantar a cabeça e viver cada dia de forma otimista, hora nenhuma se considerar doente, não se achar coitada ou que os outros devam ter pena”. Rosa está preparada para enfrentar mais uma cirurgia – a reconstituição plástica das mamas

PROJETO MULHERES PELA VIDA

A psicóloga do setor de mastologia da Liga Norte-riograndense Contra o Câncer de Mama, Rossana Curioso é responsável por um projeto desenvolvido em parceria com o Instituto Avon, chamado “Mulheres pela Vida”.

O projeto — cuja parte prática se estendeu por oito meses no distrito sanitário oeste abrangendo os bairros de Felipe Camarão, Guarapes, Cidade Nova, Nova Cidade, Bairro Nordeste, Monte Líbano, Bom Pastor, Nazaré, Novo Horizonte, Quintas e Cidade da Esperança — teve como objetivo principal o aumento da detecção precoce do câncer de mama na capital. Durante esse período, foram atendidas mulheres de 50 a 69 anos – faixa etária considerada de alto risco – que se cadastravam nas unidades de saúde locais e tiveram a oportunidade de fazer a mamografia e, caso detectada alguma anomalia, encaminhadas ao tratamento na Liga.

Embora o projeto tenha o final programado para meados de novembro, a atividade educativa permanece e, principalmente, a propagação da idéia de que o câncer de mama tem cura e da importância do auto-exame. Segundo Curioso, ainda mais importante do que o projeto em si, é a mensagem propagada e a intenção de fazer com que as unidades de saúde comecem a atender casos de mama além de aumentar o número de mamografias por parte do governo.[photopress:DSC02328_2_1.jpg,full,centralizado]
Rosa: “ter muita fé, levantar a cabeça e viver cada dia de forma otimista”

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