Ailton Salviano – Publicado em O Jornal de Hoje (04.04.2009)

Há quarenta anos quando o governo baiano começou a construir o Centro Administrativo de Salvador cunhou uma frase exemplar que foi aposta em todas as obras. Até hoje guardo na memória: “Aqui, a Bahia constrói o seu futuro sem destruir o seu passado”. Em pleno século 21, os governantes do Rio Grande do Norte, apesar de muitos alertas, fazem exatamente o contrário.

Afora o valor histórico, quanto valem hoje o Estádio João Cláudio de Vasconcelos Machado, o ginásio Humberto Nési e todos os prédios que comportam a administração do governo do Estado e suas secretarias? Será que o Rio Grande do Norte é tão rico para destruir todo esse patrimônio e construir no mesmo lugar outro estádio e novos prédios para administração apenas com requintes mais modernos?

Não sou contra a construção de um novo estádio. Mas, por que não construí-lo em outro local, sem destruir o nosso tradicional Machadão? Espaço há de sobra na área metropolitana de Natal. Enquanto a classe política emudece, os defensores do atual projeto pautam esse comportamento em duas discutíveis premissas: o financiamento privado e a alavancagem do turismo. Tenho minhas dúvidas a esse respeito.

Antes mesmo de saber se vão abrigar alguns jogos, prefeituras de outras cidades reconhecidamente pobres começaram a gastar no embalo do sonho. Duas multinacionais de consultoria – a Price Waterhouse e a Delloite já paparam 5 milhões de reais (Agência Folha) para realizar estudos de viabilidade técnica. Os gastos, sem licitação, se estendem a viagens e participações em eventos. Até agora, só dinheiro público!

Em 2003, quando não havia crise, a Alemanha uma das maiores economias do mundo, preparava os seus estádios para sediar a copa de 2006. Dos 12 estádios que seriam utilizados, 8 foram somente reformados e modernizados. Estive lá e presenciei “in loco”. Naquela ocasião, o vice-presidente do comitê organizador, Horst Schmidt declarou que sem a participação de dinheiro público seria impossível concluir as obras.

Estive também na França durante a Copa de 1998. Conversei com pessoas envolvidas com o turismo nas cidades de Paris, Nantes, Bordeaux e Lourdes. Todos reclamavam da ausência de turistas que fugiram da copa. Sim! É verdade! A copa poderá atrair turistas, mas apenas aqueles que gostam de futebol e durante o evento. Nenhuma família européia vai se aventurar a vir ao Brasil durante a copa.

Na época da copa em 1998, numa Paris deserta de turistas, visitei o Louvre, a Torre Eiffel, a Sacre Coeur, Notre Dame e outros locais históricos sem o transtorno das filas. A multidão concentrava-se apenas no entorno dos estádios. Em Bordeaux, com dois empresários natalenses, fomos os únicos clientes daquela sexta-feira em um famoso restaurante local onde eram servidos os melhores vinhos da franceses.

Ouvi atentamente a entrevista concedida a uma estação de rádio local pelo arquiteto Moacyr Gomes, autor do projeto do Machadão e o grande responsável na luta para cessão daquele terreno. Concordo plenamente com tudo que ele falou. Por trás dessa demolição não existe apenas o interesse de construir-se um estádio. Será que não existem procedimentos muito mais efetivos e econômicos para promover o nosso turismo?

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