A FARRA DAS PASSAGENS AÉREAS
Ailton Salviano Publicado em O Jornal de Hoje em 23.04.2009
Por mera coincidência, no mesmo momento em que passageiros dos trens do Rio de Janeiro eram açoitados por agentes de segurança da concessionária SuperVia, parlamentares em Brasília davam à nação as mais absurdas explicações sobre o uso das passagens aéreas a que têm direito por conta de um regimento anacrônico e esdrúxulo.
Os dois fatos podem ser associados embora tenham características bem distintas. Enquanto o trabalhador assalariado paga para chegar ao trabalho e se utiliza dos superlotados vagões dos trens urbanos, uma espécie de casta especial ou senhores com uma das maiores faixas salariais que a nação sustenta, transformam os bilhetes aéreos que lhe são graciosamente ofertados, em objetos de barganha e os utilizam para levar amigas, namoradas e parentes para viagens de lazer.
O pior é que esses senhores representam legalmente aqueles trabalhadores e alguns pertencem a partidos ditos socialistas! E o que dizer dos destinos das viagens? Nova York, Paris, Madri, Miami, Frankfurt, Buenos Aires e Santiago. Desnecessário acrescentar que são localidades “top” do turismo internacional. Em resumo, o dinheiro dos nossos impostos está sendo usado para familiares de políticos fazerem turismo. Mas, para eles, a culpa é do regimento.
Com as caras-de-pau mais cínicas do mundo, tais parlamentares tentam justificar o injustificável. Frases como: “A família é sagrada”; “Ela era a minha companheira”; “Ela foi resolver um problema de saúde”; “Não há nada de errado nisso!” Viajei de madrugada, para acumular essas passagens”; “Se está no Regimento, não está errado”; Sim, antes de acobertarem-se com a desfaçatez do Regimento, deveriam usar a consciência.
Quanta vergonha! Como se não bastasse os milhares de reais que cada parlamentar e familiares gastam por mês com celular (pagos pelo erário), agora temos que engolir essa farra! Nunca na história desse país, o povo foi tão vilipendiado. As medidas corretivas que se anunciam são ainda mais ineptas. “Vamos diminuir 20% a verba para as passagens!”, bradou o presidente do Senado. Em outros termos, poderia ter dito: agora ao invés de cinco viagens a Paris, vocês farão apenas quatro!
Até quando teremos que engolir tudo isso? Não foi essa a democracia que me ensinaram e que alguns colegas na Universidade morreram por ela. Só nos resta invocar a célebre frase de Abraham Lincoln: “Podeis enganar toda a gente durante um certo tempo; podeis mesmo enganar algumas pessoas todo o tempo; mas não vos será possível enganar sempre toda a gente”.