OS ESPANHÓIS, OUTRA VEZ
Ailton Salviano
Veja essa história: em setembro de 1940, um grupo de intelectuais alemães refugiados na França fugia da Gestapo (polícia nazista). Na região dos Pirineus, fronteira França/Espanha, mais precisamente na cidadezinha de Portbou, os germânicos foram barrados pela alfândega espanhola. No grupo, um senhor de talhe frágil, óculos de aro, aparentando extremo nervosismo, não resiste à tensão psicológica e comete suicídio.
O suicida tentava chegar a Portugal, país neutro na Segunda Guerra, e daí viajar para os Estados Unidos. Deixara Paris, um dia antes da invasão dos alemães e havia conseguido visto para entrar nos “states” no mês anterior. O episódio poderia ser interpretado à luz da psicologia individual, se aquele personagem não fosse o escritor Walter Benjamin, um dos grandes pensadores da Escola de Frankfurt.
A Escola de Frankfurt, como ficou mais conhecido o Instituto de Pesquisas Sociais de Frankfurt, era uma instituição que congregava o que seria hoje o “top” da reflexão crítica cuja corrente de pensamento abrangia a sociedade, a economia, a política e cultura daquela época. Benjamin, de ascendência judia, foi ensaísta, crítico literário e o conhecimento da sua obra é obrigação para estudiosos da filosofia, sociologia e ciências da comunicação.
Aspectos e semelhanças desse fato com os intelectuais alemães e dos estudantes barrados na capital espanhola na última semana são mera coincidência. Os dois incidentes, separados por quase setenta anos, apresentam algo em comum – a inflexibilidade das autoridades hispânicas com pessoas em trânsito que não pretendem permanecer no país e apenas chegar ao vizinho Portugal.
O fato dessa semana, intensamente condenado pela mídia brasileira, torna-se mais deplorável por nós potiguares por conta da fraterna acolhida que dispensamos aos turistas espanhóis que nos visitam. Como se comportariam as autoridades ambientais da Espanha se algum grupo brasileiro tentasse implantar em solo espanhol um projeto que atentasse com o meio-ambiente afetando a paisagem e o ecossistema do seu litoral?
Aqui, com a hipócrita tese de “criação de empregos”, acolhem-se forasteiros de todas as plagas sem se saber a fonte dos recursos que pretendem aplicar entre nós. Os esporádicos casos de deportação de espanhóis acontecidos em Salvador são meros reflexos do dia seguinte. A experiência mostra que esse procedimento não vai continuar. Lá eles vão prosseguir com a política de repressão aos imigrantes brasileiros; aqui, continuaremos a dizer “bienvenidos hermanos!”