A ARTE DE SER POBRE
Ailton Salviano
Analisar a vastíssima bibliografia sobre auto-ajuda é perceber sem grande esforço, um segmento de incontáveis livros que ensinam as mais diversas formas e caminhos para o bem-estar, o sucesso e a riqueza. Viver rico, com exceção de poucos problemas inerentes à classe, não chega a ser tão difícil nem se faz necessário, grandes artifícios ou ginásticas para suplantar o dia a dia.
Artista, sob todos os aspectos, é ganhar um salário-mínimo no Brasil e ter que alimentar a família, pagar aluguel, comprar material escolar, pagar transporte, comprar remédios e freqüentar a praia ou o estádio de futebol nos finais de semana.
Impressiona, conversar com um vendedor ambulante de produtos falsificados e ouvir dele que daquela atividade, ele tira o sustento da família, mantém a filhinha de 6 anos na escola e consegue juntar alguns trocados para visitar os familiares no interior durante os festejos do Natal. Realizar todas estas tarefas com a alegria de viver, sem nenhuma revolta e sempre encarar com um sorriso as adversidades é, sem dúvida, uma arte.
Na atividade profissional de geólogo de campo, por circunstâncias do trabalho, mantive ao longo de três décadas, contato direto com pessoas paupérrimas em quase todos os estados brasileiros, a maioria vivendo abaixo do que chamam agora, linha de pobreza.
Porém, sob esse parâmetro miserável, havia algo que transcendia todas as teorias sociais que tentassem explicar esse comportamento humano. Apesar da pobreza, a maioria tinha prazer de viver e uma sincera satisfação em dividir o pouco que dispunha com os circunstantes. Havia entre eles, compreensão e confiança, respeito para com aquela condição social e sempre presente, a esperança em dias melhores.
Entre muitas personagens com esse perfil, conheci na década de 80 numa pequena cidade do interior do Ceará, o casal Zequinha e Rosa. Ele, agricultor, analfabeto, havia sido contratado temporariamente por nossa equipe de prospecção mineral, para abrir picadas e trincheiras com uma diária de 10 reais. Ela era professora leiga do município, ganhava mensalmente, 1/3 do salário mínimo para ensinar diariamente as primeiras letras a 12 crianças que moravam na redondeza.
Era um ano de seca e aquela atividade para Zequinha, segundo ele, era um presente dos céus. No final do dia, antes do por do sol, toda a equipe de pesquisa se recolhia ao pequeno alpendre da casa de taipa onde Zequinha morava com a mulher e dois filhos. Chegara a oportunidade de se discutir as atividades daquele dia e traçar os planos para o dia seguinte.
Em um início de semana, Rosa me mostrou uma carta com o timbre da prefeitura, o órgão responsável para elaborar a lista de famílias que participariam do bolsão, uma ajuda oficial para as vítimas da seca. A correspondência informava que Rosa tampouco o seu esposo, poderia participar do bolsão. Ela por ser “funcionária” municipal; ele, por ter um emprego temporário.
A tragicomicidade daquela situação era que o bolsão tinha um valor bem superior ao ínfimo salário que ela recebia da prefeitura e o grande dilema era: “deixar de ensinar para ter direito ao bolsão”. Rosa, pelo raciocínio das autoridades municipais, estava diante da “versão miserável do acúmulo de cargos ou funções”. Embora o bolsão tivesse a duração apenas de seis meses, o montante deste período era maior que o salário anual de Rosa.
Mesmo indignada com aquele inusitada situação, a humilde professora tomou uma decisão louvável – optou continuar ensinando! Segundo ela própria, aquela era a sua sina!
Essa atitude comovente e exemplar daquela modesta mulher foi lembrada durante muito tempo pela equipe de pesquisa. Mais de três décadas se passaram e infelizmente, pouca coisa mudou daquele quadro social. Mudaram apenas alguns políticos e o nome da pretensa ajuda aos miseráveis!
Arthur Tavares Cortês
Dignidade assim, comove.
Pessoas que pensam no papel de educadores, como ela, e, acima de tudo, seres humanos incorruptíveis, merecem ser louvados!
Mais que artistas, empresários ou guerrilheiros violentos.
Não se deixar levar pela facilidade pelo simples fato de acreditar em si mesmo e em seus esforços…
Dona Rosa que deveria ser presidente da república…
Alan E. Wootton
Meu Amigo Ailton,
Visite http://deviajante.blogspot.com/2006/06/o-que-ser-pobre.html para ver como é bom ser pobre!
Abraços – Alan